Em coletiva, autoridades chinesas exaltaram nova política de isenção de vistos e rebateram críticas ocidentais sobre aproximação a países latinoamericanos
Zhang Run, diretor-geral de América Latina e Caribe do Ministério de Relações Exteriores da China(Photo: Guilherme Paladino / Brasil 247)Guilherme Paladino / Brasil 247
Por Guilherme Paladino, de Pequim, para o 247 - Quase um mês após a 4ª Reunião Ministerial do Fórum China-CELAC, autoridades chinesas voltaram a defender com firmeza a importância da América Latina e do Caribe na política externa do país. Em entrevista coletiva realizada nesta segunda-feira (9) em Pequim, representantes do Ministério das Relações Exteriores da China reafirmaram que os laços com a região têm valor estratégico de longo prazo e rechaçaram críticas à aproximação sino-latino-americana, classificando-as como infundadas.
O evento, que reuniu jornalistas locais, correspondentes estrangeiros e diplomatas, teve falas do diretor do Departamento da América Latina e Caribe do MRE chinês, Zhang Run, e da vice-diretora geral da pasta, Tang Lingyun. Entre os principais temas abordados estiveram o legado da cúpula China-CELAC, a nova política de isenção de vistos para países latino-americanos e o recém-lançado Tribunal Internacional de Mediação em Hong Kong.
✱ Aceno ao Brasil
Ao ser questionada sobre as expectativas chinesas para a cúpula dos BRICS e sobre os próximos passos da relação sino-brasileira, Tang Lingyun afirmou que, até o momento, o Ministério das Relações Exteriores "não tem nenhuma informação a compartilhar" sobre os preparativos do encontro em território brasileiro. No entanto, a diplomata destacou o papel central que o Brasil ocupa na visão de longo prazo da China para a região.
"Em novembro passado, quando o presidente Xi Jinping visitou o Brasil para a cúpula do G20, nossas relações se elevaram ao novo estágio de Comunidade de Destino Compartilhado", afirmou Tang. "Neste ano, também tivemos o privilégio de receber a visita do presidente Lula e publicamos um memorando de entendimento e uma declaração conjunta. A China sempre prestou atenção às perspectivas de longo prazo nas relações com a América Latina, e queremos desenvolver nossa relação com o Brasil por muito tempo. O Brasil também é um país muito importante do Sul Global, e mantivemos boas relações entre nós."
Tang citou como exemplo o consenso sino-brasileiro de sete pontos sobre a crise na Ucrânia e a criação conjunta do grupo "Amigos da Paz". Por fim, a vice-diretora afirmou que a China "espera agregar ainda mais valor aos BRICS no futuro".
✱ “Não buscamos hegemonia”
Na abertura da coletiva, o diretor Zhang Run fez um longo pronunciamento em que apresentou um balanço da cúpula China-CELAC realizada em maio, destacando a aprovação da Declaração de Pequim e do Plano de Ação Conjunto 2025–2027, que contempla "mais de 100 projetos" de cooperação.
Zhang citou os elogios de Lula ao resultado da cúpula: "o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, disse que a declaração de Pequim é um documento histórico, especialmente aos países da região da América Latina e Caribe, e aos países pobres".
O diretor também abordou de forma direta as críticas à crescente presença chinesa na região, geralmente oriundas de fontes políticas e estratégicas dos Estados Unidos:
"Alguns países e pessoas vêm ameaçando abertamente os Estados da CELAC para que escolham um lado e lutem contra a influência do Partido Comunista da China no hemisfério ocidental. Isso está condenado ao fracasso. Nossa cooperação é baseada nas relações Sul-Sul e nos princípios de respeito mútuo e benefício recíproco. Não há jogo de soma zero. O Pacífico é suficientemente amplo para não ser sacudido por nenhum vento ou onda."
Zhang também reiterou que a China não busca hegemonia na região, e que apoia a autonomia estratégica da América Latina e do Caribe, incentivando cada país a perseguir seus próprios caminhos de modernização.
✱ Isenção de visto e Fórum de Mediação Internacional
Um dos anúncios mais celebrados nas últimas semanas — e que foi novamente citado na coletiva — é a isenção de vistos para cidadãos do Brasil, Argentina, Chile, Peru e Uruguai, que entrou em vigor em 1º de junho. Segundo Zhang, trata-se de uma medida "estratégica" para aprofundar o aprendizado mútuo, estimular o turismo, os negócios e o intercâmbio cultural entre a China e os países latino-americanos.
Outro destaque do evento foi o incentivo à adesão de países da região ao novo Fórum Internacional de Mediação, lançado oficialmente em Hong Kong no último dia 30 de maio. A China afirmou que já conta com cinco países latino-americanos signatários e convida outros a se juntarem à iniciativa. O objetivo declarado da nova corte é oferecer uma alternativa acessível, pacífica e multilateral para a resolução de disputas internacionais, em um momento de fragilidade e desconfiança nas instituições tradicionais.
✱ Relação consolidada e perspectivas
Com um comércio bilateral que ultrapassou a marca de US$ 500 bilhões em 2024, a China se mantém como segundo maior parceiro comercial da América Latina, e o principal de países como Brasil, Chile, Peru e Uruguai. Atualmente, 68 Institutos Confúcio estão ativos em 26 países da região, e mais de 90% dos chineses entrevistados em pesquisa recente do Global Times declararam apoiar a intensificação da cooperação com a América Latina.
A relação com o Brasil, em especial, ganhou novos contornos desde o retorno de Lula à presidência. Xi Jinping foi recebido com honras de Estado em Brasília no fim de 2024, e retribuiu o gesto em maio deste ano, quando Lula participou da cúpula China-CELAC em Pequim e da assinatura de 20 atos bilaterais de cooperação.
A expectativa agora se volta para julho, quando os líderes dos BRICS se reunirão no Brasil. Ainda que autoridades chinesas evitem antecipar posicionamentos, há sinais claros de que Pequim deseja usar o bloco como plataforma para a construção de uma nova ordem multipolar, mais representativa do Sul Global — com o Brasil como aliado-chave nesse processo.
Fonte; Brasil 247
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