Supremo julga ações que contestam mudanças aprovadas em 2019 e pode derrubar regras sobre contribuição, tempo mínimo e aposentadorias especiais
A reforma da Previdência de 2019 voltou ao centro do debate diante da possibilidade de mudanças profundas a serem definidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As decisões, que podem alterar parâmetros de aposentadorias e pensões do INSS e do funcionalismo, reacendem discussões sobre sustentabilidade fiscal e proteção social. As análises decorrem de uma série de ações diretas de inconstitucionalidade que contestam trechos da Emenda Constitucional 103, informa a Folha de S.Paulo.
A Corte examina, de forma conjunta, 13 ações diretas e outros processos paralelos que discutem idade mínima, forma de cálculo dos benefícios, limites para aposentadorias especiais e cobrança de contribuição de aposentados e pensionistas. O julgamento foi interrompido após pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, embora esteja na pauta de 3 de dezembro, junto com dois outros processos que tratam de regras de invalidez e aposentadoria especial.
✱ Divergências no plenário e risco de mudança em pontos centrais
O relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou pela manutenção da reforma, enquanto o presidente do STF, Edson Fachin, divergiu. Já existe maioria formada para derrubar dois pontos: a alíquota de contribuição de servidores aposentados e o tempo mínimo de contribuição exigido de mulheres no serviço público, hoje fixado em 20 anos — superior aos 15 anos exigidos no INSS.
Um dos trechos mais sensíveis trata da autorização para que estados e municípios cobrem contribuição de aposentados que ganham acima de um salário mínimo. Para salários mais altos, a reforma ainda permitiu alíquotas superiores às aplicadas a trabalhadores da ativa.
Leonardo Rolim, consultor da Câmara dos Deputados, considera a cobrança indispensável para equilibrar as contas públicas. Segundo ele, sem essa arrecadação, estados e municípios enfrentariam impacto fiscal imediato. São Paulo, por exemplo, perderia cerca de R$ 1 bilhão por ano.
“Se o STF mantiver essa tendência de revogar diversos itens da emenda constitucional 103, irá ampliar substancialmente esse déficit”, afirma.
Paulo Tafner, diretor-presidente do IMDS e pesquisador da Fipe, avalia que derrubar a contribuição dos servidores representaria uma “hecatombe fiscal”, já que governos poderiam ter de devolver valores recolhidos. Ele critica o que considera uma interferência do Judiciário: “fazer política pública” sem respaldo legislativo.
Aposentadoria por invalidez está entre os pontos mais contestados
Outro processo sensível é o que discute o cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente, atualmente fixado em 60% da média salarial mais 2% por ano adicional de contribuição.
O advogado João Badari aponta distorções. Segundo ele, quem se aposenta por invalidez recebe menos do que quem está afastado temporariamente pelo auxílio-doença. “O benefício da doença grave é 31% menor do que o da doença temporária. Isso fere a isonomia e o princípio de proteção social”, diz.
Regras da aposentadoria especial também são questionadas
As restrições impostas à aposentadoria especial, como idade mínima e proibição de converter tempo especial em comum, são foco da ADI 6.309, proposta pela CNTI.
Adriane Bramante, conselheira do IBDP e da OAB-SP, ressalta que trabalhadores que atuam em ambientes insalubres foram prejudicados. “Se o segurado não tiver 25 anos de tempo especial, o tempo de trabalho dele não serve para nada. Isso é flagrantemente inconstitucional”, afirma.
Ela critica a falta de estudos técnicos para definir idade mínima e lembra que o benefício busca preservar a saúde de quem exerce funções nocivas. Segundo Adriane, o impacto fiscal dessa modalidade é reduzido — apenas 0,24% das concessões.
A especialista também menciona decisão relacionada à ADI 7.727, na qual o STF derrubou idade mínima maior para mulheres policiais. “As mulheres têm família e trabalho igual. Trabalho é trabalho. Não se pode diferenciá-las por isso”, conclui.
O que está em jogo nas decisões do STF
Aposentadoria especial
- Contestação da idade mínima de 55, 58 e 60 anos
- Proibição da conversão de tempo especial em comum
- Novo cálculo com redução da média salarial
- Caso será julgado em 3 de dezembro
Cobrança de contribuição de aposentados e pensionistas no serviço público
- Contesta alíquotas entre 7,5% e 22%
- Pode levar à devolução de valores já recolhidos
Idade mínima para mulheres no serviço público e para mulheres policiais
- STF tende a igualar tempo mínimo de contribuição entre servidoras e seguradas do INSS
- Liminar já derrubou idade mínima igual à dos homens para policiais mulheres
Cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente
- Redutor de 60% questionado
- Auxílio-doença paga mais que aposentadoria definitiva
- Tema tem repercussão geral e será decidido em 3 de dezembro
As decisões do Supremo poderão redefinir parâmetros aplicados desde 2019, influenciando futuros beneficiários, as contas dos regimes próprios e o equilíbrio financeiro do sistema previdenciário. A expectativa em torno dos julgamentos é alta, dada a possibilidade de mudanças que afetam diretamente milhões de trabalhadores e aposentados em todo o país.
Fonte: Brasil 247 com informações da Folha de S. Paulo



