Segundo o Datafolha, em 2022, 4% dos eleitores afirmaram ter sofrido algum tipo de assédio eleitoral
Ex-presidente Jair Bolsonaro em casa, em Brasília, durante prisão domiciliar determinada pelo STF 14/08/2025 REUTERS/Adriano Machado (Foto: Reuters)
Um levantamento realizado pela Folha de S.Paulo na Justiça do Trabalho mostra que diversas empresas brasileiras foram condenadas por praticar assédio eleitoral em favor do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a campanha presidencial de 2022. Entre os métodos registrados nos processos, há relatos de ameaças de demissão, promessas de folga, distribuição de brindes e até a oferta de peças de pernil em troca de votos.
O fenômeno, que remete ao chamado voto de cabresto praticado na República Velha (1889-1930), foi amplamente denunciado no pleito mais recente. Ao todo, a reportagem identificou 30 decisões judiciais em primeira e segunda instância em que companhias foram consideradas culpadas por tentar manipular o voto de seus trabalhadores por meio de pressão, intimidação ou promessas de vantagem.
◈ Exemplos de assédio comprovados na Justiça
Em Minas Gerais, a Agronelli Ltda. foi condenada por colar adesivos de Bolsonaro em mesas e computadores e por promover palestras sobre o então presidente. Um diretor chegou a afirmar que, caso o PT vencesse, a empresa seria prejudicada e funcionários poderiam perder seus empregos.
No Paraná, a Transben Transportes foi punida por enviar vídeos aos colaboradores pedindo que votassem em Bolsonaro. Na gravação, um representante dizia: “Se o Lula ganhar vai ter desemprego. A nossa empresa vai sofrer bastante”. Além disso, a companhia ofereceu auxílio financeiro para motoristas que viajassem a fim de votar no ex-presidente.
Já no Espírito Santo, a Febracis foi condenada a indenizar uma funcionária em R$ 10 mil por tentar coagi-la. Segundo o processo, gestores diziam que a eleição era uma “guerra espiritual”, apresentando Bolsonaro como “enviado de Deus” e Lula como o “Diabo”.
Outro caso de destaque ocorreu em Minas Gerais, no Frigorífico Serradão, em que trabalhadores receberam camisetas amarelas com slogans bolsonaristas e a promessa de um pernil para quem comprovasse o voto em Bolsonaro. Para a Justiça, os vídeos anexados demonstraram “apoio explícito a um candidato imposto pela empresa”.
◈ Demissões e perseguições
Em depoimento, um motorista da Sada Bioenergia e Agricultura, com 12 anos de empresa, disse ter sido demitido aos 64 anos após recusar o uso de adesivo de Bolsonaro. Segundo a sentença, “o respeito à formação de convicção política de forma autônoma e livre é condição essencial à democracia”.
Na Radiodoc (SP), funcionários foram alertados de que “sofreriam as consequências” se não votassem no então presidente. A empresa também prometeu folga para quem participasse de eventos da campanha.
◈ Impacto nacional
Relatórios do Ministério Público do Trabalho (MPT) apontam que, em 2022, foram registradas 3.145 denúncias de assédio eleitoral em todo o país. Para enfrentar o problema, o órgão firmou 560 termos de ajuste de conduta e ajuizou 105 ações civis públicas.
Em uma dessas ações, a SLC Agrícola S.A., do Piauí, foi condenada a pagar R$ 100 mil em danos morais coletivos. A empresa teria escalado 34 funcionários para trabalhar em fazenda distante dos locais de votação no segundo turno, sem fornecer transporte, dificultando que votassem.
A Fomentas (MT) também foi condenada a pagar R$ 50 mil após imagens mostrarem funcionários com uma faixa de apoio a Bolsonaro e registros de reuniões em que vídeos contrários a Lula eram exibidos.
◈ Risco à democracia
Especialistas alertam que o assédio eleitoral coloca em xeque a integridade do sistema democrático. Para a professora de direito constitucional e eleitoral Eneida Desiree Salgado, da Universidade Federal do Paraná, “assim como o voto de cabresto no contexto do coronelismo da Primeira República, o que está em jogo não é apenas a liberdade de um voto. Com a existência do assédio eleitoral, toda a lisura do sistema é posta em risco”.
Pesquisas confirmam a dimensão do problema: segundo o Datafolha, em 2022, 4% dos eleitores afirmaram ter sofrido algum tipo de assédio eleitoral durante a campanha.
Fonte: Brasil 247 com informações da Folha de S. Paulo
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