Um diálogo inédito pelo WhatsApp entre o tenente-coronel Mauro Cid e seu pai, o general Mauro Lourena Cid, expõe os bastidores da reação do núcleo bolsonarista à derrota de Jair Bolsonaro (PL) no primeiro turno das eleições de 2022. As mensagens, trocadas entre 2 de outubro (noite da apuração) e os dias seguintes, mostram a perplexidade e as primeiras teorias sobre os resultados que deram 48% a Lula contra 43% de Bolsonaro.
Na noite da apuração, o general enviou uma mensagem de consolo ao filho: “Boa noite filho! Estamos juntos! Não deu agora? Vai dar certo na próxima!!”. Mauro Cid não respondeu imediatamente, só reagindo no dia seguinte através de áudios onde manifestava surpresa com os números.
“Realmente foi uma pancada um pouco forte. A gente que era do núcleo mais operacional do presidente, nas viagens, pé no chão, contato com o povo, a impressão era primeiro turno ou sair na frente, largar na frente pro segundo turno”, disse o então assessor de Bolsonaro.
O tom das mensagens revela a dissonância entre a percepção da equipe de campanha e os resultados oficiais – narrativa que depois seria usada para questionar as urnas.
“Mas o grupo político, o pessoal que já tem mais cancha de eleição, inclusive mostraram isso ontem. O grupo político já tinha levantado esse percentual, 48 a 44, só que a gente não conseguia ver isso na rua. Muito estranho isso aí”, continuou Cid, ecoando o discurso que alimentaria as teorias de fraude eleitoral.
O general Lourena Cid, contemporâneo de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) nos anos 1970 e então diretor da Apex em Miami, reforçou a narrativa do filho.
“É, ontem foi, eu imagino como você ficou aí, filho. Mas tamos torcendo aí, vai dar tudo certo”, respondeu, antes de questionar a lógica dos resultados: “O lado positivo também é quantos senadores, governadores, deputados estaduais ele fez aí, muito bacana. Então realmente é completamente ilógico o cara votar nos quatro e no último não conseguir votar, né, isso foi danado”.
As mensagens mostram ainda a confiança do núcleo bolsonarista numa virada no segundo turno. Cid citou previsões internas de que Bolsonaro abriria 10 pontos percentuais sobre Lula após as alianças: “E esse mesmo pessoal que fez essa previsão tá dizendo que agora, com as alianças pro segundo turno, é dez por cento, ele bate dez por cento à frente do Lula. Vamos ver se realmente vai acontecer”.

Após a derrota definitiva no segundo turno, o general voltou a contatar o filho pedindo uma avaliação do cenário: “Posso ajudar? Como vc está?”. A resposta de Cid foi evasiva: “era necessário esperar ‘a poeira baixar’ para avaliar o cenário”.
O material não revela conversas sobre as articulações golpistas que ocorreriam nos meses seguintes, embora pai e filho tenham mantido ligações pelo WhatsApp cujo conteúdo permanece desconhecido.
A defesa de Mauro Cid informou que não comentaria os diálogos por não ter tido acesso ao material completo. As mensagens reforçam como o discurso de fraude eleitoral foi construído imediatamente após os primeiros resultados desfavoráveis, antes mesmo de qualquer análise técnica, a partir da percepção subjetiva da equipe bolsonarista sobre o “contato com o povo”.

Fonte: DCM
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