
Mensagens extraídas do celular de Jair Bolsonaro (PL), apreendido pela Polícia Federal (PF) em maio de 2023, revelam articulações políticas do ex-presidente, tentativas de se manter influente após deixar o Planalto e sua rede de contatos com empresários, parlamentares e até diplomatas. Com informações do Estadão.
O conteúdo reúne 7.268 arquivos entre conversas de WhatsApp, áudios, vídeos e documentos. A maior parte das mensagens foi enviada na semana anterior à apreensão, e trechos mais antigos haviam sido apagados.
As conversas são de 2023, período em que o celular foi apreendido — ou seja, não têm relação com o aparelho recolhido pela PF na operação do último dia 18, que resultou na imposição de tornozeleira eletrônica e outras medidas judiciais ao ex-presidente.
☆ Bolsonaro orientou aliado a assinar CPI contra Moraes
Entre os registros, uma conversa de 26 de abril de 2023 mostra Bolsonaro orientando o deputado Hélio Lopes (PL-RJ) a assinar o pedido de abertura de uma CPI contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), incluindo Alexandre de Moraes. Hélio demonstrava receio de assinar e comprometer o ex-presidente.
“Boa noite, presidente. A galera tá me pressionando aí porque Eduardo, todo mundo assinou essa CPI de abuso de autoridade do TSE e do STF e eu não assinei até agora porque… eu não queria entrar nessa bola dividida, com medo de prejudicar até o senhor mesmo nas decisões lá. O que o senhor acha aí mais ou menos?”, questionou o parlamentar.

Bolsonaro respondeu: “Eu assinaria. Sempre existe a possibilidade de retaliações”. Em seguida, Hélio confirmou: “Já assinei”. A proposta de CPI havia sido apresentada em 2022 pelo deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), mas até hoje não avançou no Congresso.

É o mesmo Hélio Lopes que montou uma barraca na Praça dos Três Poderes, próximo ao prédio do STF, na semana passada. O deputado, que ficou conhecido nas redes sociais como “Negão do Bolsonaro”, colocou esparadrapo na boca e anunciou um protesto contra as medidas judiciais impostas pelo ministro Alexandre de Moraes ao ex-capitão.
Moraes, no entanto, determinou a retirada do acampamento. Em sua decisão, o magistrado argumentou que as medidas tinham o objetivo de evitar um novo 8 de Janeiro.
☆ Bolsonaro articulou contra PL das Fake News com Eduardo
Outra conversa mostra Bolsonaro instruindo seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), a atuar contra o PL das Fake News, que tratava da regulação de plataformas e combate à desinformação. Em 2 de maio de 2023, Jair alertou que a proposta iria a plenário naquele dia.
Às 19h39, Eduardo informou: “Orlando Silva acabou de pedir para retirar de pauta o PL 2630”. Bolsonaro respondeu: “Tem que votar hoje”. Eduardo concluiu: “Manifestei pela votação hoje, como líder da minoria”.
O projeto foi apelidado por bolsonaristas de “PL da Censura” e acabou sendo enterrado pelo então presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
☆ Ex-embaixador ofereceu viagem com tudo pago a Israel
O ex-embaixador de Israel no Brasil, Yossi Shelley, também aparece nas mensagens. Em 26 de abril, Shelley enviou a Bolsonaro vídeos de uma tecnologia israelense de carne feita por impressora 3D.
Bolsonaro respondeu com elogios e mencionou Benjamin Netanyahu: “Fala Shelley. Realmente é uma revolução né, proteína, carne em 3D. Parabéns aí pra vocês e vamo ver né qual o futuro dessa máquina aí. Um abraço e um abraço aí no nosso amigo Netanyahu”.
Logo depois, Shelley convidou Bolsonaro para visitar Israel: “Vem nos visitar?”. E ofereceu pagar a viagem: “Vou cuidar de você 14 semanas em Israel, vou pagar o custo de sua presença, hotel e tal por 3 pessoas se vc quiser”. Corrigiu a mensagem minutos depois: “14 dias”.
Bolsonaro agradeceu e respondeu: “Ô Shelley, obrigado, vou falar com a esposa aí e ver o que ela acha. Obrigado, um abraço”. Ele encaminhou o convite a Michelle, mas ela não respondeu.
A conversa ocorreu no final de abril de 2023, dias antes de Bolsonaro ter sido alvo de operação da Polícia Federal por suspeita de fraudes em certificados de vacina.

☆ Bolsonaro queria manter apoio do agronegócio
As mensagens mostram ainda o esforço de Bolsonaro para manter apoio do setor agro mesmo fora do governo. Em listas de transmissão, ele compartilhava críticas à política de demarcações de terras indígenas e ações do MST no governo Lula. “Cada vez mais problemas para o agro”, escreveu. “Com Bolsonaro: ZERO demarcações”.
Em conversas com o general Walter Braga Netto, seu ex-ministro e candidato a vice em 2022, Bolsonaro discutiu estratégias para reforçar sua imagem entre produtores.
Braga Netto disse que buscaria dados com a ex-ministra Tereza Cristina para o ex-presidente usar no Agrishow, feira do setor em Ribeirão Preto, em abril de 2023. A ida de Bolsonaro provocou atritos com integrantes do governo Lula.
Em um dos áudios, Bolsonaro reagiu a um editorial do Estadão que o chamava de “risco para o agronegócio”. Ele rebateu irritado: “Pô, acaso eu é que tô demarcando terra pra índio? Eu é que tô impulsionando o MST a invadir terras? Eu que tô fazendo lambança aí fora pra ter problemas com outros países no tocante ao fornecimento de fertilizantes. É foda né, é sinal que a gente tá bem, se tivesse mal o Estadão não estaria fazendo essa matéria aí”.
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