terça-feira, 24 de junho de 2025

PCC se infiltra em 28 países, recruta em presídios no exterior e amplia tráfico internacional de drogas

A informação consta em um mapeamento do Ministério Público de São Paulo

    (Foto: Reuters)

O Primeiro Comando da Capital (PCC) já está presente em pelo menos 28 países, incluindo na Europa, onde membros da facção paulista têm se infiltrado em presídios, recrutado novos integrantes e ampliado o tráfico internacional de drogas, armas e a lavagem de dinheiro. A informação consta em um mapeamento do Ministério Público de São Paulo obtido pelo g1, que vem sendo apresentado a embaixadas e consulados para reforçar a cooperação internacional no combate ao crime organizado.

O relatório revela que, mais do que realizar operações pontuais no exterior, o PCC tem buscado se fixar de forma estruturada em outros países — uma estratégia que representa risco crescente para as autoridades internacionais.

“O maior perigo do PCC é a sua origem prisional, onde eles têm poder de organização e de ideologia, uma disciplina muito rígida e que se dissemina muito fácil no sistema prisional”, explica o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, referência no combate à facção. Segundo ele, a facção tem aprendido com criminosos europeus, especialmente italianos, no que diz respeito à logística de drogas e ao envio de dinheiro sem circular formalmente.

O levantamento do MP-SP aponta que o PCC segue um modelo de expansão bem definido: inicia operações pontuais para negócios, mas, ao decidir estabelecer residência fixa, passa a estruturar o recrutamento, o "batismo" de novos membros e a formação de uma rede de controle, especialmente dentro dos presídios.

A pesquisadora da Universidade Federal do ABC (UFABC) e especialista em criminalidade organizada, Camila Nunes Dias, destaca esse movimento. “Quando há uma fixação, há um interesse de controle, de estabelecimento da estrutura do PCC. E isso implica que vai haver aí a busca ativa, com estratégias de recrutamento, seja de outros brasileiros, seja das pessoas nativas daquele país”, afirma.

◉ Portugal e o risco de consolidação europeia

Portugal ocupa lugar de destaque no mapa de expansão do PCC na Europa. Com forte conexão histórica e cultural com o Brasil e grande número de imigrantes brasileiros, o país tem sido escolhido pela facção como porta de entrada, ponto logístico e residência de importantes líderes do tráfico.

O país já aparece como o quinto com maior número de integrantes da facção fora do Brasil, segundo o relatório. Casos como a apreensão de um semissubmersível com 6,5 toneladas de cocaína na costa portuguesa, em março, reforçam as suspeitas de que o território lusitano esteja sendo usado tanto para o tráfico quanto para o branqueamento de capitais.

Roberto Uchoa, pesquisador da Universidade de Coimbra e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, alerta para o avanço da organização criminosa. “O PCC busca se consolidar como um dos principais players no tráfico internacional de drogas, principalmente porque aí ele consegue se capitalizar em euros e dólares, o que faz com que a sua capacidade de corrupção e de atuação no Brasil seja ainda maior”, afirma.

Outro indício dessa infiltração é o caso do traficante André do Rap, foragido da Justiça brasileira, que viveu por pelo menos um ano em Portugal antes de se mudar para a América Central. A presença de mergulhadores especializados recrutados pelo PCC para esconder drogas em cascos de navios e o suborno de funcionários portuários portugueses são outros exemplos concretos do avanço da facção no país.

◉ Itália e os laços com a máfia

A aliança entre o PCC e a máfia italiana, especialmente a ‘Ndrangheta, da Calábria, também preocupa autoridades brasileiras e europeias. Investigações reveladas por um delator italiano preso no Brasil mostraram como os carregamentos de cocaína saíam em grandes quantidades para abastecer as famílias mafiosas na Europa.

Nesta terça-feira (24), Brasil e Itália formalizam um acordo inédito de cooperação entre o Ministério Público brasileiro e a Procuradoria Nacional Antimáfia e Antiterrorismo da Itália. O objetivo é criar equipes conjuntas e permanentes de investigação para combater o tráfico e o crime organizado.

◉ Expansão em outros continentes e alerta para o terrorismo

Além da Europa e da América Latina, o PCC já atua em países da Ásia e Oceania. No Japão, por exemplo, a facção se aproveita do alto valor da cocaína na região para lucrar, enquanto a Austrália também aparece como mercado estratégico.

Na Sérvia e no Líbano, o foco das autoridades recai sobre o tráfico de armas e indícios de convergência entre o PCC e grupos especializados em lavagem de dinheiro com possível conexão com o financiamento do terrorismo.

O promotor Lincoln Gakiya explica: “Isso pode indicar que operadores financeiros estejam atuando ali naquela região, facilitando a lavagem, tanto para o PCC quanto para organizações que financiam o terrorismo”.

Relatórios do Coaf e informações de inteligência de Israel apontam movimentações financeiras suspeitas envolvendo fintechs brasileiras e criptomoedas com indícios de ligação a organizações terroristas.

◉ Desafios e necessidade de integração internacional

Para especialistas, a resposta à atuação transnacional do PCC passa por acordos de cooperação, como o recém-assinado entre Brasil e Interpol, e pelo fortalecimento da integração entre os países afetados.

“Aqui é tudo muito novo, eles [europeus] não têm experiência com esse tipo de atuação, de começar no presídio para depois se expandir”, afirma o pesquisador Roberto Uchoa.

A coordenadora do Observatório de Segurança Pública e Cidadania na América Latina, Marcelle Figueira, reforça a necessidade de uma estratégia nacional robusta. “É absolutamente necessária a criação do Ministério da Segurança Pública. A segurança pública é uma questão do Brasil, além das disputas partidárias. Sem prioridade nesse tema, nossa democracia e cidadania seguem ameaçadas”, alerta.

Diante do avanço do PCC pelo mundo, o desafio brasileiro se torna global, exigindo resposta coordenada, integração de inteligência e enfrentamento firme ao crime organizado, que já não conhece fronteiras.

Fonte: Brasil 247 com informações do G1

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